XXVII
“As folhas rebentam. Em breve a galeruca, que é uma
pequena lagarta verde, vai instalar-se nas folhas do olmo e as devorará. A
árvore será como que privada dos seus pulmões. Vai ver, para resistir à
asfixia, crescerem novas folhas e a primavera viver uma segunda vez. Mas estes
esforços vão esgotá-la. Um ano após outro, verá que não vai conseguir estender
as suas novas folhas, e morrerá.”
Assim gemia um amigo das árvores, enquanto nos passeávamos
no seu parque. Ele mostrava-me olmos centenários e anunciava-me o seu fim
próximo. Disse-lhe: “É preciso lutar. Esta pequena lagarta verde não tem força.
Se se pode matar uma, podem-se matar cem e mil.”
“O que é um milhar de lagartas? Respondeu ele. Há milhões,
Prefiro não pensar.” “Mas, digo-lhe eu, você tem dinheiro. Com o dinheiro
compram-se dias de trabalho. Dez trabalhadores laborando dez dias matarão mais
de um milhar de lagartas. Não é capaz de sacrificar algumas centenas de francos
para conservar estas belas árvores?”
“Tenho demasiadas, disse ele; e tenho poucos
trabalhadores. Como alcançarão os ramos altos? Seriam precisos podadores. Só
conheço dois na terra.”
“Dois, digo-lhe eu, é já alguma coisa. Eles vão ocupar-se
dos ramos altos. Outros, menos hábeis, vão servir-se de escadas. E se você não
salvar todas as suas árvores, salvará pelo menos duas ou três.”
“Falta-me a coragem, disse por fim. Eu sei o que vou
fazer. Vou-me daqui por uns tempos, para não ver esta invasão de lagartas.”
“Ó poder da imaginação, respondi eu. Ei-lo derrotado antes
de ter combatido. Não olhe para além das suas mãos. Nunca se agiria, se se
considerasse o peso imenso das coisas e a fraqueza do homem. É por isso que é
preciso agir e pensar a sua acção. Veja este pedreiro; ele roda tranquilamente
a sua manivela; a enorme pedra quase não
se mexe. No entanto a casa será acabada, e haverá crianças a saltar nas
escadas. Admirei outrora um operário que se instalava com o seu berbequim, para
furar uma muralha de aço que tinha bem uns quinze centímetros de espessura. Ele
rodava o seu instrumento assobiando; as finas lascas de aço tombavam como uma
neve. A audácia deste homem impressionou-me. Já lá vão dez anos. Esteja seguro
que ele furou esse buraco e muitos outros. As próprias lagartas nos dão a
lição. O que é uma lagarta comparada com um olmo? Mas todas essas pequenas
dentadas devorarão uma floresta. É preciso ter fé nos pequenos esforços e lutar
como um insecto contra o insecto. Mil
causas trabalham por si, sem as quais não haveria olmos. O destino é
instável; um piparote cria um mundo
novo. O mais pequeno esforço arrasta sequelas sem fim. Aquele que plantou estes
olmos não deliberou sobre a brevidade da vida. Lance-se como ele na acção sem
olhar mais longe do que os seus pés, e salvará os seus olmos.”
Alain
(Tradução de José Ames)
Sem comentários:
Enviar um comentário