LII
Neste tempo de férias, o mundo está cheio de pessoas que
correm dum espectáculo a outro, evidentemente com o desejo de verem muitas
coisas em pouco tempo. Se é para falar disso, nada melhor; porque vale mais ter
vários nomes de lugares a citar; isso enche o tempo. Mas se é para eles, e para
realmente verem, eu não os compreendo bem. Quando se vêem as coisas a correr
elas parecem-se muito. Uma torrente, é sempre uma torrente. Assim, aquele que
percorre o mundo a toda a velocidade não é de todo mais rico de recordações no
fim do que no princípio.
A verdadeira riqueza dos espectáculos está no detalhe.
Ver, é percorrer os detalhes, parar um pouco em cada um e, de novo, apreender o
todo com um olhar. Não sei se os outros podem fazer isso depressa, e correr a
outra coisa, e recomeçar. Quanto a mim, não o poderia. Felizes os de Rouen que,
cada dia, podem olhar todos os dias uma coisa tal e aproveitar de Saint-Ouen,
por exemplo, como dum quadro que se tem em casa.
Enquanto se se passa num
museu uma única vez, ou num país de turistas, é quase inevitável que as
recordações se confundam e formem enfim uma espécie de imagem cinzenta de
linhas baralhadas.
Para o meu gosto, viajar, é fazer de cada vez um metro ou
dois, parar e olhar de novo um novo aspecto das mesmas coisas. Muitas vezes,
ir-se sentar um pouco à direita ou à esquerda muda tudo, e muito melhor do que
se fizesse cem quilómetros.
Se vou de torrente em torrente, encontro sempre a mesma
torrente. Mas se vou de rochedo em rochedo, a mesma torrente torna-se outra a
cada passo. E se volto a uma coisa já vista, na verdade ela prende-me mais do
que se fosse nova, e realmente ela é
nova. Trata-se apenas de escolher um espectáculo variado e rico, a fim de não
adormecermos no hábito. É preciso dizer ainda que, à medida que se sabe ver
melhor, um espectáculo qualquer encerra alegrias inesgotáveis. E depois, de
todo o lado, podemos ver o céu estrelado; eis um belo precipício.
Alain
(Tradução de José Ames)
Sem comentários:
Enviar um comentário